Desde os primeiros tempos que me aventurei a dar os passos iniciais no jornalismo, lá pelo final da década de 1960, ouvia dos já calejados repórteres e gráficos que “jornal sem um belo parque gráfico é igual a um caracol sem casa”... A tradição no mercado da mídia impressa, desde priscas eras, rege que uma empresa deve ter uma impressora de qualidade, pois uma página para conquistar o leitor precisa estar recheada de notícias interessantes e imagens que causem admiração pelas suas cores e nitidez. O conjunto da obra na confecção de um jornal só é perfeita, ou no mínimo satisfatório, se houver um sólido casamento entre esses dois requisitos.

Quando nasceu o jornal Umuarama Ilustrado, nos idos do inverno de 1973, o sonho perseguido pelo companheiro Ilídio Coelho Sobrinho era esse: ter um jornal, com muita informação e bonito por natureza. Mas, os tempos eram outros e não existia a tecnologia que há hoje no setor gráfico. As impressoras de antanho eram rústicas, antiquadas e de difícil manutenção. Além disso, impressoras novas só podiam ser compradas no exterior e custavam verdadeiras fortunas. O recurso, então, era procurar uma de segunda mão, mas em perfeito estado de conservação.

Depois de tanto rodar pelo interior de São Paulo, Ilídio encontrou uma acessível aos recursos que tinha em mãos para lançar o Ilustrado. Ela até que era bonitinha, estava bem preservada e atendia os desejos do projeto do novo jornal para Umuarama: imprimir em tamanho tablóide (hoje esse formato virou moda por medidas de economia de papel), em duas ou três cores, se possível, para oferecer aos leitores e anunciantes um produto diferente do que existia em circulação por aqui.

O jornal tinha lançamento previsto para junho daquele ano, com uma edição no aniversário de Umuarama. Mas, como já contei e recontei em oportunidades anteriores, o prédio alugado onde funcionariam a redação e a gráfica foi literalmente “atropelado” por um baita caminhão FNM, colocando abaixo a metade da estrutura.

Entre os escombros, permanecia inerte a coitada da primeira impressora do Ilustrado, gravemente avariada... Nem chegou a imprimir a edição piloto.

Foi uma amargura tremenda, tanto para Ilídio, que passou noites acordado sonhando com o lançamento do jornal e para mim que amargava uma ansiedade tremenda de ser o primeiro editor do semanário e mostrar serviço, como para os companheiros da gráfica que tinham deixado a impressora brilhando de tanto polimento e carinhos para que rodasse, pela primeira vez, macio e produzindo uma bela impressão.

Nós todos, ainda na flor de nossa juventude repleta de idealismo e planos para o futuro, choramos que nem crianças, mas nos levantamos das cinzas e encontramos forças para renascer e recomeçar tudo de novo.

Depois de amargar um tremendo prejuízo com o acidente, as paredes da primeira sede do Ilustrado, ali no baixadão da Avenida Brasil/saída para Xambrê, foram colocadas em pé outra vez. Por incrível que possa parecer, depois de uma recauchutagem e funilaria completas, a pobre impressora estava pronta e em forma para uma nova vida de muito trabalho pela frente. É bem verdade que ficou toda remendada, com soldas em várias partes vitais, mas mostrou que era feita de aço do mais resistente calibre e não seria um caminhão que iria “aposentá-la”.

Chegava o domingo 5 de agosto de 1973. Durante dois dias inteiros a antiga impressora rodou leve e solta, imprimindo milhares de páginas da edição primeira que marcaria a história de um matutino que continua firme e sólido até hoje, prestando serviços e mantendo bem informado seu fiel leitorado.

Para essa edição decidimos que a capa e a última página seriam impressas em azul (os títulos das manchetes e o cabeçalho do jornal) e preto (os textos e as fotos, claro). Afinal, nada como começar um empreendimento dando o primeiro vôo num céu azul de brigadeiro risonho e límpido para dar sorte. Como o sistema de impressão plana da época era rudimentar se comparado com os avançados recursos das rotativas de hoje, até que o Nº 1 do Ilustrado deu um banho de estética gráfica, se comparado com os jornais que circulavam aqui no Noroeste.

O formato, então, chegou como uma novidade para os leitores que estavam acostumados a ler aqueles jornalões que, se abertos, mediam mais de um metro de largura. Era prático, agradável de ler e ver e, principalmente, reunia um noticiário diferenciado daquele que costumeiramente era publicado pela “Tribuna do Povo” e pela “Gazeta de Umuarama”, que voltavam a maior parte de seu espaço editorial à política, melhor dizendo, à badalação dos políticos de então. Mas essas são minúcias que quase me fizeram esquecer que o tema central deste texto é a nossa primeira impressora.

Num momento de humor, daqueles que aliviam a tensão das tarefas cansativas de fazer jornal, a turma da gráfica resolveu batizar a impressora de “Catarina”. Um apelido carinhoso escolhido meio que sem noção, mas que pegou. E, para os precursores do Ilustrado, até hoje ela continua sendo “Catarina”, esteja ela onde estiver (deve ter virado sucata e acabou derretida em alguma fundição por aí...)

Imprimir jornal na “Catarina” era uma lou-cu-ra, algo impensável nos dias de hoje, uma tarefa de artistas. Obra artesanal mesmo! Façam a contas: uma edição com dois mil exemplares, imprimindo duas páginas de cada vez e multiplicadas por 24 páginas. É mão de obra e paciência, pacas! E era um tal de pára, continua, pára e roda, pois o impressor e o ajudante tinham de estar atentos para ver se as páginas estavam sendo bem impressas, sem borrões, papel enrrugado ou textos-fotos tremidos. Acrescente-se a isso, o trabalho de ter que estar colocando as tintas nos tinteiros a toda hora, regulando rolos e conferindo se as chapas de chumbo (onde estavam os textos-fotos) estavam firmes.

Como esse tipo de impressora não dobrava jornais (como as rotativas atuais), essa tarefa ficava a cargo dos jornaleiros. E depois as folhas impressas eram intercaladas 4 por 4 até formar o caderno completo, pronto para a circulação. Todo esse sacrificado serviço varava as noites, madrugadas e o jornal só chegava às ruas quando o sol saudava a cidade nas primeiras horas da manhã...

A edição de lançamento deveria chegar às mãos da população no domingo 5 de agosto. Mas, era tanta a aflição de ver o Ilustrado circulando pela primeira vez, que resolvemos de última hora que o jornal seria distribuído na tarde do sábado. Ilídio, eu e mais uns voluntários amigos, saímos pelos quatro cantos da cidade entregando pessoalmente a primeira edição, de mão em mão, nos bares, sorveterias, nas praças e esquinas onde havia gente proseando no fim de semana. Presenteávamos a todos com um exemplar. Era uma alegria tão intensa e antes nunca sentida por nós ver que as pessoas festejando o nascimento de um novo jornal. Essas manifestações nos concederam a sensação de uma alegria que não há dinheiro que pague.

Missão cumprida, toda a edição estava espalhada pela cidade. Voltamos à noitinha para o jornal. Na penumbra de apenas uma lâmpada acesa no canto interno do prédio, me encantei com a cena que não esqueço jamais: lá estava dormitando, quietinha em seu lugar, a velha “Catarina”, repousando merecidamente de sua primeira grande jornada.

De seu ventre havia saído o jornal feito com carinho, suor e sonhos de uma turma de jovens valentes. Ela foi a nossa fiel companheira de labuta durante vários anos, até que um dia ela saiu de cena para entrar na história de nossas vidas e da memória do Ilustrado.

Certamente tudo no Ilustrado continuará mudando, assim como nós mudamos também, mas, por mais tecnologia, reformas, modismos e outros investimentos que surgirem para que este diário acompanhe o avanço dos tempos modernos, ainda vou continuar com aquela lembrança da velha impressora sempre presente na minha alma. É isso! (ITALO FÁBIO CASCIOLA)

OS: Estavamos juntos nessa grande aventura: Ilídio Coelho Sobrinho, Ademyr Olívio Bortot, Adylton Sérgio Bortot, Francisco Carlos Ruiz, Seneval Viana, Milton Pereira e Lindoval Luiz Ercolin e este escriba, formando a galera precursora naquele distante agosto de 1973, sob um frio tenebroso típico daqueles invernos cruéis de antigamente. Provamos a nós mesmos que um sonho que se sonha juntos torna-se possível de ser realizado. Que fique de exemplo para os sonhadores e jovens escribas que estão chegando agora...


Fonte: Umuarama Ilustrado

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